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Você está fugindo ou essa perambulação é seu jeito de criar? #diáriodeescrita

Essa semana estive determinada a observar minhas tentativas de fuga durante o processo de escrita, sabe? Quando tudo está indo bem ou não, e nossa atenção salta de repente para um livro que fica ao lado, o celular ou a poeira entre um e ouro quartzo, “devo ter esquecido esse cantinho, melhor limpar”.


Até duas ou três semanas atrás, minha busca tinha sido outra, mais simples. Eu sentaria na cadeira e pronto. Não iria mais fugir. Não iria mais perambular pela casa ou pelos livros, não iria mais regar as plantas no meio da escrita, e eu acreditei nisso quando falei, acreditei mesmo. Mas logo veio o incômodo, a energia baixa, escrevendo no meu diário descobri que a perambulação pela casa faz parte do meu processo criativo.


Escrevo mil coisas ao mesmo tempo. Às vezes vou lavar a louça no meio de uma frase, faz parte do meu movimento. Quando tentei conter, pensava: imagina botar toda essa força em um só impulso? Mas isso prendeu minha sensibilidade perambuladora, ela que encontra a palavra final de um verso no meio de colheres ensaboadas e da redinha do ralo cheia de arroz.


Seria mais fácil se essa perambulação fosse apenas distração, porque aí eu buscaria descobrir caminhos internos para não me distrair tanto, para conseguir focar sem me interromper, ao invés de super focar e dali a pouco virar página e sair voando. Mas agora eu preciso diferenciar o movimento de fuga do movimento de criação, os dois em altíssima velocidade, tanto que quando estou no olho do furação parecem a mesma dança. No meu corpo, porém, eles impactam de forma quase oposta.


Papel com um poema impresso e rabiscos à mão independentes do poema.
As primeiras palavras deste texto surgiram quando eu estava gravando o vídeo do último post.

A perambulação transforma o corpo em texto, eu danço, eu pulo, abro espaço para as memórias respirarem entre os músculos. A perambulação transforma a casa em texto, eu mexo nas coisas como uma maneira de mexer nos meus projetos, corpo, casa, texto, tudo vira símbolo, portal e guardião. Na fuga não. A fuga é um desespero, uma sensação de que vou morrer a qualquer momento, porque no fundo é isso, escrever é estar sempre morrendo, a cada segundo a sensação de que eu vou acabar, então às vezes vem junto o impulso de fazer outra coisa, mais branda, algo que tenha a densidade de uma pausa, algo que substitua o silêncio.


Nessa última semana, trabalhar em um único projeto me ajudou a observar com mais calma esses movimentos. Estou procurando me entender um segundo antes de fugir, me pergunto qual é o medo, do que estou fugindo, escrevo sobre isso no meu diário e, se for possível, transformo a fuga em perambulação, digo: “você pode ir regar as plantas, mas vai levar com você o livro”.


A semana em 2 fotos. Escrevendo na foto 1. Imagens do vídeo poética manifesto na foto 2.



E você, já se pegou fugindo no meio de uma frase? Já fez inventário dos seus medos?

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